domingo, 23 de fevereiro de 2014

Minha Vida: Capítulo 1: "MEU BEM, MEU MAL"

Bem pessoal, estou aqui mais uma vez, para escrever o primeiro capítulo da minha “minissérie”. Como sou noveleiro assumido, cada capítulo terá o nome de uma novela ou minissérie que gostei muito e, claro, que tenha a ver com o momento que quero descrever. Lembramos do fio condutor? Amor, certo? Ok. Comecemos então.

Era o ano de 1980. Em 29 de julho eu nascia em Campo Grande, bairro da zona oeste da cidade do Rio de Janeiro. Terceiro filho de Adélia e... Jaime (depois vocês entenderão as reticências). Considero que fui uma criança feliz e inocente até meados dos 9, 10 anos. O terreno da casa que morava era bem grande. Nele havia a minha e mais duas ocupadas por parentes da parte do meu pai. Em uma delas, a maior, moravam minha avó, minha tia e todos os seus sete ou oito filhos. Não lembro. Preferi apagar. Na rua perpendicular à minha, moravam meus avós maternos e a irmã caçula da minha mãe, minha madrinha, Nanci. Apesar disso, era distante geograficamente para uma criança.

Lembro de momentos felizes. São lapsos de memória que me permito recordar. O batizado do meu irmão mais novo, Felipe, por exemplo. Lembro também, da primeira festa de aniversário que ele teve, onde a minha mãe aproveitou o seu nascimento no mês de junho e fez uma festa junina, com direito a bolo de fogueira. Um feito para a época que se faziam apenas  festas de palhaço com cabeça de isopor em cima do bolo... Meu quarto tinha quatro camas, todas elas com colchas iguais, confeccionadas pela minha mãe. Ela comprava metros e metros de pano e produzia as colchas e as capas dos travesseiros. Nas paredes, quadros de madeira com desenhos do Walt Disney, que meu pai desenhava e pintava. Acho que o único dom que herdei dele que preferi manter. As festas de Natal e Ano Novo também eram legais. Ficávamos o dia inteiro na cozinha preparando a ceia, eu e meus irmãos arrumávamos a casa, passávamos cera no chão (aqueles com “vermelhão”, que deixavam a sola do pé manchada...rs). Lembro também que uma semana antes, minha mãe (ah... quantas saudades dela...), limpava o telhado por dentro, pois estavam sempre cheios de teias de aranha. Depois, comprava cal (uma espécie de pó branco combinado à água que faz as vezes de tinta, só que bem mais barato) e misturava em um corante qualquer para mudar as cores das paredes, arrumando a casa para os festejos de fim de ano. Lembro da última cor que pintamos: amarelo.

Meu pai, pelo que me lembro, sempre trabalhou à noite e minha mãe virou dona de casa logo depois que casou. Até que, quando eu ainda muito criança (fui saber tempos depois), minha mãe descobriu que ele mantinha um relacionamento extraconjugal há muitos anos, quase o mesmo tempo daquele casamento, que eu, na minha inocência, considerava feliz.  Uma conclusão eu tirei depois de tantos anos que se passaram: Ela realmente o amou. E AMOU MUITO. Assim como amou todos os seus filhos, de maneira tão intensa que viveu seus poucos 43 anos como se 80 fossem. Não posso me estender em muitos detalhes, pois existem duas situações que me impedem: detalhes da minha vida que são só meus e outros que deixariam essa história longa demais. Vou ater-me aos principais momentos para que vocês possam entender lá na frente. Lembro que mais tarde, minha mãe descobriu que além de ter uma amante, ela visitava a casa da minha avó, levando o “neto”. Lembra da maior casa do meu quintal? Sim nesta casa. Eu recordo claramente de um dia ter brincado com meu irmão, sem saber que ele era filho do mesmo pai. Anos depois, minha mãe descobriu isso tudo. Brigou com todos e ainda foi agredida pela minha tia, irmã dele. Coisas de novela? Não. A mais pura verdade. A vida real. Ela sofreu muito. E por amar, perdoou. A ele e a toda a sua família conivente com toda aquela história suja.

Minha mãe...exemplo de mulher. Exemplo de ser humano. Talvez um exemplo que não quis ter, somente admirar, para não passar pelo mesmo sofrimento. Aí começava a me tornar um homem mais duro e mais maduro para aqueles quase 10 anos de idade.

Cerca de dois anos depois, meu pai arrumou um outro emprego e....outra amante! Caramba! Depois de tudo que minha mãe sofreu, novamente estávamos vivendo aquelas discussões em casa, "eu te amo pra lá", "me perdoa pra cá", e todas aquelas histórias que vão minando qualquer relação de amor.  E qualquer relação de respeito que um filho possa ter por um pai. MEU BEM, MEU MAL. Já era maior, entendia das coisas e o sofrimento da minha mãe me consumia. Até que ele começava a vir dia sim, dia não, para casa. Depois semana sim, semana não. E depois mês sim, mês não. Ela sempre o aceitava. Ela o amava. Ele por sua vez, deixou por completo suas obrigações de pai. Minha mãe voltou a trabalhar fora. Lembro que de início fazia às vezes de doméstica na casa do meu avô. Lavava, limpava, fazia comida e ele sempre a ajudava. Ela fazia os afazeres, pois não queria ser simplesmente sustentada pelo meu avô. E meu pai... Nem notícias. Minha mãe começou então a trabalhar como copeira em um clube perto da minha casa: o Campo Grande Atlético Clube. Lembro até hoje d´ela chegando em casa com um saco plástico com restos de comida, que ela alegava para seus supervisores ser para os cachorros e de dentro dele tirava um outro saquinho bem protegido e em seu interior havia queijo e presunto, que ela dava a mim e aos meus irmãos. A grana era muito pouca para uma mulher e quatro filhos, então o que complementava a nossa refeição era a “xepa” do sacolão. Esse sacolão existe até os dias de hoje. De vez em quando eu vou lá... Estou escrevendo agora e sorrindo lembrando da nossa comida: um dia arroz com ensopado de cenoura, no outro com ensopado de chuchu e no outro com ensopado de batata e por aí seguia com qualquer resto de legume que ela conseguia recolher. Orgulho demais de ter tido essa mãe. Na verdade, tive sorte. Creio nisso. Meu irmão mais velho, Vitor, já estava fazendo uns bicos e trabalhava em um aviário (aqueles locais onde vendem aves, vivas e mortas) próximo a minha casa, ajudava a minha mãe ocupando o lugar e absorvendo uma responsabilidade de pai, que era do meu pai, no “alto” dos seus 17 anos. E assim íamos seguindo. Foi nessa época que comecei a me revoltar com ele...Jaime (entenderam a reticências agora?). Já não aceitava suas idas e vindas sem explicação. Resolvi fazer a minha parte: estudar. Estudava muito. Comia livros. E por isso, vou dedicar um capítulo somente à minha formação.

Sempre gostei de novelas. Era um mundo de fantasias igual aos livros que lia. Naquela época, estava no ar uma chamada "MEU BEM, MEU MAL", de Cassiano Gabus Mendes. Entre tantas tramas, algumas coisas me marcaram: foi a última da atriz Lídia Brondi, havia uma personagem muito popular interpretada por Vera Zimmerman, chamada “Divina Magda”, pelo mordomo Porfírio, interpretado por Guilherme Karam, no núcleo principal da novela: a mansão dos Venturini. Mas existia uma que me chamou a atenção: um homem pobre, Doca (Cássio Gabus Mendes), que teve que conviver com a alta sociedade para vingar as amarguras do passado de uma outra madame vivida pela Isis de Oliveira (sim, a irmã da Luma). Na verdade, queria ser como ele. Também transitar entre o mundo de pessoas elegantes e bem sucedidas, mas com outro objetivo: mostrar que apesar de tudo havia vencido.

Muitos anos depois de comer arroz ensopado com chuchu, eu estaria ministrando palestras em congressos fora do estado e participando de jantares no salão nobre do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Novela? Não. Vida real, que segue nos próximos capítulos...

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